Sobre a linguagem como meio universal ou como cálculo - II parte.

 A oposição calculus ratiocinator versus characteristica universalis como apresentada na postagem anterior tem um caráter absoluto, com base em um resultado estabelecido recentemente por mim (veja postagem, neste blog, sobre a publicação dos Proceedings of the 19th Brazilian Logic Conference - XIX EBL, no Journal of Applied Logics - IFCoLog Journal of Logics and their Applications, Vol. 9 N. 1, 2022, do paper intitulado: "A note on Tarski´s remarks about the non-admissibility of a general theory of semantics", pp. 573-582), pois a partir do seguinte pressuposto: 'toda metalinguagem consiste em uma linguagem que admite, como objeto, outra linguagem (denominada de linguagem-objeto)'; nesta acepção, poderíamos indagar sobre a possibilidade de uma metalinguagem última, que desempenharia o papel de uma linguagem universal. Como o resultado estabelecido é bastante técnico, estou me restringindo apenas a algumas consequências filosófico-conceituais da demonstração da conjectura de Tarski.

    Por exemplo, Epstein (2002) sugere a possibilidade de reincorporar uma linguagem universal para a lógica com sua metalógica (veja referência bibliográfica no final do texto) no seguinte excerto (p. 472): "In the writings of Buridan there is no distinction between logic and metalogic. One language and system of reasoning is to suffice. Nor did Frege, or Russell and Whitehead, employ a distinction between logic and metalogic. Their goal was to create one precise perspicuous language for reasoning in which logical relations among propositions would be evident.

The self-referential paradoxes seemed to make that goal unattainable. Frege's system was inconsistent; Russell and Whitehead had recourse to a stratified language that is in essence a hierarchy. Since Tarski's analysis of truth, most modern logicians have taken metalogic to be distinct from logic.

A satisfactory analysis of self-referential paradoxes in a language with its own truth-predicate suggests that a re-incorporation of logic and metalogic is possible." [meus itálicos].

    Tarski conjecturou que seria incorreto supor que a relativização do conceito de verdade (a uma dada linguagem) poderia servir de base para uma teoria geral deste conceito, de tal modo que seria possível abranger todas as linguagens formalizadas, haja vista que a linguagem de uma teoria geral da verdade poderia conter uma contradição, analogamente, como ocorre com as linguagens naturais (que são semanticamente fechadas). De fato, com foi demonstrado, no artigo referenciado acima, não é possível construir uma linguagem universal que formalizasse uma semântica geral. O resultado foi estabelecido no âmbito de uma 'aritmetização' estrito senso das linguagens de ordem superior e de ordem transfinita para uma semântica geral da aritmética recursiva de ordem superior e transfinita. Consequentemente, ao contrário do que advoga Epstein, a resposta, para o problema acima, é negativa, i.e., não há um substrato linguístico-formal que permite compatibilizar as duas concepções de linguagem (ou seja, a concepção de linguagem como 'meio universal' e, a concepção de linguagem como 'cálculo de raciocínio').

       De um modo geral, a prova da conjectura de Tarski acarreta consequências além do campo da filosofia da linguagem, a saber, no âmbito: da linguística computacional, da teoria da complexidade algorítmica, dos fundamentos da matemática, etc.

________________________

Epstein, R. (2002)    A Classical Mathematical Logic: the semantic foundations of logic. Princeton University Press.

    

     

Comentários