sábado, 26 de novembro de 2022

Sobre o Formalismo (parte I)

 O professor Amadeo Peter Hiller --em um artigo intitulado "A matemática e o infinito" para o Suplemento Cultural do jornal "O Estado de São Paulo", datado de 16/04/1978, Ano II, Número 78, pp. 9-10-- apresenta, de modo didático e concisamente, os principais pontos propostos pelo projeto de Hilbert para a fundamentação da matemática, a saber:

  1. "Dividir o universo das proposições matemáticas em duas partes, as que se referem a objetos finitários 'reais' e as que se referem aos objetos infinitários 'ideais'."
  2. "Dado um raciocínio em que se demonstra uma proposição real a partir de hipóteses 'reais', mas em que no meio do arrazoado foram usadas proposições referentes a objetos 'ideais', mostrar que existe um raciocínio diverso, provando a mesma conclusão a partir das mesmas hipóteses, em que não aparecem proposições 'ideais'."
  3. "Fazer o anterior usando métodos matemáticos insofismáveis, i.e., finitários, e, também, provar a coerência do sistema todo usando os mesmos métodos."
Conforme observado por Hiller (1978), se este programa fundacional fosse exequível, o chamado 'problema do infinito' deixaria de existir. De acordo com Hiller: "Pode-se pensar nos objetos infinitários como algo que só existe num sentido metafórico, ... um modo de falar, ... Trabalhar com o Infinito significa, então, trabalhar com proposições ideais. Para verificar se uma sequência [p. ex., da forma] A então B então C então D de proposições é uma dedução de D a partir de A não importam os significados das proposições envolvidas; ... o que importa é saber pela forma de A e de B se a inferência  A então B é correta, pela forma de B e de C se a inferência B então C é correta; pela forma de C e de D se a inferência C então D é correta. ... Realizado o Programa, toda inferência  em que aparece uma proposição ideal deve ser testada somente levando-se em consideração a forma das proposições envolvidas." Ainda, segundo Hiller, o desenvolvimento desse Programa requer, como Hilbert reconheceu, uma álgebra cujos objetos são fórmulas aritméticas (denominada por Hilbert de metamatemática). Por conseguinte, a operação principal (abstrata) dessa álgebra é a inferência. Esse cálculo algébrico metamatemático é conhecido como a Teoria da Prova de Hilbert. Nesta teoria, foi explicitado de modo preciso a definição de prova, i.e., uma sequência formal de inferências contendo termos que expressam as hipóteses e a conclusão da prova. De acordo com Hilbert, a ausência de uma contradição pode ser interpretada da seguinte forma: "Não há duas sequências formais que, partindo dos mesmos axiomas lógicos como hipóteses, cheguem a conclusões opostas."
    Como observa o Prof. Jairo da Silva, em seu livro "Filosofia(s) da Matemática" de 2007, Editora da Unesp, páginas 196-197: "O segundo problema da lista [da famosa lista de problemas matemáticos proposta por Hilbert no II Congresso Internacional de Matemáticos, em Paris, ocorrido em 08 de agosto de 1900] pedia que se demonstrasse a 'compatibilidade dos axiomas aritméticos'. Isso já levanta algumas questões: 1) A que aritmética se referia Hilbert? 2) Pro que seriam necessárias demonstrações de consistência de teorias verdadeiras, como são, supõe-se, as aritméticas usuais dos números naturais, racionais e reais? (Haveria alguma razão para se duvidar que elas fossem, de fato, verdadeiras?) 3) Que ferramentas matemáticas seriam admissíveis nas demonstrações de consistência; ou seja, essas demonstrações deveriam ser levadas a cabo em que contexto matemático?"

    Essas questões e outros aspectos do Programa de Hilbert serão discutidas na próxima postagem.

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