segunda-feira, 26 de setembro de 2022

Sobre o Intuicionismo (parte III)

 A crítica de Brouwer é dirigida ao conceito de infinito atual na matemática. Com efeito, afirma Brouwer, o infinito não deve ser definido como 'totalidade dada' (i.e., infinito atual); deve ser entendido, exclusivamente, como possibilidade em uma sucessão ilimitada, ou seja, como infinito potencial. Como consequência imediata dessa posição temos a rejeição da legitimidade geral do princípio do terceiro excluído. Este princípio estabelece o seguinte: dada uma sentença 'φ' vale a asserção ' φ v ~φ ' (em outros termos, ou a sentença φ é verdadeira ou a sua negação é verdadeira de modo exclusivo) . De acordo com a doutrina intuicionista Brouweriana, este princípio não pode ser considerado como irrestritamente válido com relação a domínios infinitos de objetos.

    Considere-se, p. ex., uma sentença da forma: 'Existe um número natural n com a propriedade F '. (*)

    A análise intuicionista requer que a sentença (*) acima seja interpretada como se afirmasse que é efetivamente possível apresentar um número natural n com a propriedade F, i.e., Fn. Por outro lado, a negação de (*) não deve ser interpretada como a afirmação de inexistência de um número natural n com a propriedade F no conjunto N de todos os números naturais. Isto significa que, a negação de (*) deve ser entendida em um sentido mais estrito, viz., se fosse possível exibir um número natural n tal que Fn, teríamos como consequência lógica uma contradição.

    Nesta acepção, ou é possível exibir um número natural satisfazendo a propriedade F ou é possível inferir uma contradição da hipótese de que há um tal número natural. Entretanto, é concebível, em conformidade com os pressupostos intuicionistas, que não seja possível calcular um número natural n tal que Fn, nem obtermos uma contradição com base na hipótese de sua existência. Tomando-se por base este caso e outros análogos, o enfoque intuicionista admite que existem problemas indecidíveis na matemática.

    Assim, via de regra, o intuicionismo rejeita a disjunção: 'A ou não-A' , onde A expressa que: 'Existe n, tal que Fn'. Além da rejeição do princípio do terceiro excluído, não vige, p.ex., a lei da dupla negação, i.e., 'não(não-p) implica (logicamente) p'; também não vige o método de inferência indireta de existência, i.e., a inferência da existência de um objeto matemático com base no fato de que a hipótese contrária conduz a uma contradição. Outro princípio inadmissível para o intuicionismo é o método das definições impredicativas. Entende-se por tal método a definição de um conjunto por meio de um procedimento (não-construtivo) que se refere a uma totalidade a que pertence o próprio conjunto em pauta. Embora este método não seja inconsistente, há uma espécie de 'círculo vicioso' no procedimento pois, um novo conjunto é definido de tal forma que se torne necessário pressupor a existência de uma classe de conjuntos à qual pertence o próprio conjunto a ser definido. O intuicionismo admite apenas conjuntos resultantes de uma construção finitária (ou definidos mediante procedimentos recursivos).

    Na próxima postagem (parte IV), será apresentada uma comparação entre a posição do intuicionismo com a posição do programa formalista de Hilbert [a ser discutido em postagens posteriores].


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